Mulheres e Justiça Ambiental: neste 8 de março, lideranças femininas do Rio São Francisco contam ao CRESS Minas suas lutas por direitos

Publicado em 07/03/2025

No Serviço Social, o Dia Internacional das Mulheres, 8 de março, é de grande relevância considerando que 93% da categoria se identifica com o gênero feminino, como indica a pesquisa “Perfil de Assistentes Sociais no Brasil: Formação, Condições de Trabalho e Exercício Profissional”, divulgada pelo CFESS em 2022.

E considerando que neste ano, o tema do Dia da e do Assistente Social é “Serviço Social na luta por justiça ambiental para a diversidade de povos e biomas”, trazemos histórias de mulheres que se engajam em protestos e lideram movimentos por direitos e pela preservação ambiental.

Nas margens mineiras do Rio São Francisco, há sempre focos de esperança, de vida e de determinação. Os povos ribeirinhos que ali habitam, enfrentam há vários anos situações de extrema violência por parte de grandes fazendeiros que buscam a expropriação de terras dessas comunidades.

Diante desse cenário, transbordam fortes e resilientes lideranças femininas. Em fevereiro, algumas delas estiveram em Belo Horizonte para um evento promovido pelo Instituto DH, a fim de denunciar o agravamento das ameaças que enfrentam e reforçar a urgência da regularização fundiária e aproveitamos para escutá-las.

As mulheres quilombolas, assim como as demais ribeirinhas, desempenham um papel central na defesa pela terra e pelos direitos territoriais. E o trabalho é árduo e arriscado. Segundo a ONU Mulheres e a Unesco (2023), 75% das defensoras de direitos humanos no Brasil já foram alvo de violência política de gênero, incluindo assédio, perseguição judicial e deslegitimação pública.

Nos quilombos, por exemplo, acumulam múltiplas funções na busca por dignidade para si e para os seus: gerem as comunidades, mantêm o sustento e articulam redes de denúncia e de proteção. Mesmo sob ameaças constantes, lideram processos de resistência, denunciando crimes ambientais e fundiários e organizando a permanência nos territórios.

O evento promovido pelo Instituto DH no âmbito do Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas de Minas Gerais (PPDDH-MG), é uma das formas de fortalecer medidas de proteção e ampliar a visibilidade das lutas territoriais diante do avanço da mineração, do agronegócio e de outras maneiras de exploração e de apagamento dessas populações.

A luta dessas comunidades está diretamente relacionada a temas estruturais que atravessam o Brasil: o avanço predatório da mineração, a degradação ambiental acelerada e o racismo ambiental que impede que populações quilombolas e ribeirinhas tenham acesso a direitos fundamentais.

Vamos contar, então, um pouco da história de Enedina Santos e Marinalva Mendes. Para essas mulheres, o Rio São Francisco não é apenas um corpo d’água: “Ele é nosso pai, nossa mãe, nosso tudo”, define a liderança. A relação com o território vai além do físico, “nossa casa não é só onde dormimos. É toda a mata, a água, o ar.”

Enedina Santos, Cristina e Marinalva Mendes

Mesmo poluído por esgotos, barragens e mineração em muitos de seus pontos, o rio segue sendo fonte de vida, criando gerações e sustentando práticas ancestrais. “O São Francisco já criou minha avó, minha mãe, me criou e está criando minhas filhas”, complementa Enedina.

 

Crises ambientais e exploração de terras 

O rio São Francisco é um curso de água inteiramente em território brasileiro, sendo o quarto maior rio do Brasil e da América do Sul. Passa por cinco estados e 521 municípios do país, iniciando seu percurso no estado de Minas Gerais, atravessando a Bahia, Pernambuco e entre Sergipe e Alagoas para, por fim, desaguar no Oceano Atlântico.

A crise ambiental, porém, avança e afeta a vida ao longo de todo o São Francisco: desmatamento e grilagem ainda o ameaçam. Marinalva descreve: “Tentamos não deixar desmatar, degradar a beira do rio, porque o São Francisco é nosso sustento, se você chegar num espaço que tem uma comunidade e fazenda próximos, você verá que do lado deles será só pasto, e as comunidades estarão preservadas”.

As consequências da degradação ambiental são visíveis no cotidiano. Segundo elas, a extração de areia, por exemplo, tem provocado a degradação nas margens do rio, enquanto a falta de fiscalização permite que grandes empreendimentos avancem sobre áreas preservadas. Além disso, as queimadas, muitas vezes iniciadas por grileiros, tornam o território ainda mais vulnerável.

Enedina complementa: “Os danos ambientais são imensos, na terra, na água e no ar, e o que traz mudanças climáticas é o que todos os seres humanos cometem, poluição, retiradas de minérios, se não desenvolvermos consciência para cuidar do meio-ambiente, não teremos onde morar, e ninguém terá também. O mundo onde vivemos hoje, em si, pode não acabar, mas a raça humana pode.”

 

Violência e resistência feminina

A luta pelo território tem um custo alto. As ameaças de morte são constantes. Enedina e Marinalva relatam que há anos são perseguidas por fazendeiros e seus intermediários. A presença de policiais nos territórios é uma realidade que assusta, mas não as faz recuar.

“Nós somos ameaçadas 24 horas por dia”, revela Enedina. Além das intimidações diretas, há tentativas de nos criminalizar: “Eles acusam a gente de invasão, sendo que estamos lutando por terras que sempre foram nossas”. E completa, “é uma luta constante de convencer os fazendeiros que eles tem práticas irresponsáveis”.

Mesmo diante da violência, essas mulheres seguem firmes na liderança de suas comunidades. Quando questionadas sobre o impacto de serem mulheres à frente dessas lutas, elas explicam que a postura firme tem sido essencial. “Se a gente não for firme dentro da comunidade, não irão respeitar.”, diz Marinalva.

Por outro lado, Enedina, por exemplo, diz que não sente diferenças no tratamento por serem mulheres em postos de liderança, “geralmente, quando é homem já se vai para o enfrentamento, com a mulher, às vezes gera-se um receio em um primeiro momento.”

Isso não quer dizer que a violência não existe, seja de jagunços, fazendeiros, policiais, segundo as lideranças, muitos são aliciados, e se juntam a força militar e até mesmo de advogados para exercer pressão sobre as comunidades e lideranças ribeirinhas.

“Fomos sim ameaçadas de morte, e isso até hoje nunca parou, tanto diretamente, quanto indiretamente, por exemplo, por recados. Isso desde 2013 pra cá” conta Enedina, e Marinalva completa: “Querendo ou não estamos ameaçadas 24h por dia, fisicamente e psicologicamente”.

A resistência, ainda sim, não ocorre isoladamente. Elas contam com o apoio de organizações como o Instituto DH, Conselho Pastoral dos Pescadores, o Conselho Pastoral da Terra e o Ministério Público Federal. “Se não fossem esses parceiros, a gente já tinha sido tirada à força das nossas terras”, afirmam.

 

A falta de ação do Estado

Apesar da gravidade da situação, as lideranças não veem no Estado um aliado confiável. Segundo elas, a Polícia Militar frequentemente age em favor dos fazendeiros, dificultando o registro de denúncias e ignorando crimes cometidos contra as comunidades.

“Se você vai fazer um boletim de ocorrência, fica lá das sete da manhã às quatro da tarde para conseguir, isso se conseguir”, denuncia Marinalva. Além disso, como, segundo as lideranças, essas forças do Estado podem ser corrompidas, muitas vezes ouvem da própria polícia, que estão mentindo.

Mesmo com as dificuldades, elas acreditam que a luta deve continuar. A defesa do território não é apenas uma questão política, mas de sobrevivência. Além disso, fica evidente a possibilidade do uso das forças militares como uma milícia pessoal de grandes proprietários de terras.

“Lancem suas redes nas águas profundas”, segundo Enedina essa frase de uma das moradoras, e também lideranças da comunidade se traduz como um pedido por continuar lutando, e isso se mostra na história dos últimos anos, em 2013 as terras que eram de direito histórico da comunidade começaram a ser reocupadas.

Enedina conta, ainda, que é muito importante que qualquer tipo de pessoa e comunidade entenda os seus direitos, explicando que, os habitantes de comunidades que não se dão conta dos seus direitos, são mais facilmente explorados, e esse foi um dos motivos de, a partir da última década, começar pela busca pela titulação de terras da sua comunidade.

Com informações: Instituto DH.

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